Saturday, May 26, 2007

Foi por pouco

Estava eu a ter um pacato sábado, como há muito não se via por aqui, praticando duas actividades extremamente cansativas, mais precisamente falar no messenger e ouvir música, quando tocam à campainha. Publicidade, pensei eu. E como ouvi tocarem para outros andares, a minha teoria foi validada, por mim mesma, nesse instante. Passado algum tempo batem à porta, já cá em cima e eu, que não me deixo enganar facilmente por essa malta da publicidade, desenvolvi toda uma técnica para fingir que não estou em casa, que passa, nomeadamente, pela deslocação pelo hall de entrada em "pezinhos de lã" (perdoem-me o termo técnico mas vejo-me forçada a utilizar, tal a especificidade do movimento) e pelo destapar lenta e silenciosamente o orifício para espreitar lá para fora. Devo ter estas capacidades de discrição e lentidão tão desenvolvidas que quando espreitei já só fui a tempo de ver um homem subir para o andar de cima. A minha teoria, mais do que validada, estava solidificada com 100% de certezas: não só era um vendedor-de-qualquer-coisa-porta-a-porta como era daqueles armados em espertos, que tocam em todas as portas ao mesmo tempo a ver quem sai primeiro. Ainda bem que sou esperta e não fui nisso! Voltei para o quarto, mais uma ou duas frases no messenger, mais volume na música e lá fiquei, na maior. Até que, num momento de silêncio entre faixas, ouço baterem com força na minha porta. A técnica desta gente para as vendas equipara-se à minha técnica de "Sozinho em Casa III", mas vencem-me pelo cansaço. Lá vou eu abrir. Eram dois vizinhos meus, com ar preocupado, pedindo muitas desculpas pelo incómodo. E eu a pensar porque é que bateram na porta blindada em vez de usarem esse advento chamado campainha. Percebi antes de perguntar: a electricidade do prédio estava cortada. Ok. Havia uma fuga de gás. Ok. Era preciso desligar o quadro eléctrico. Ok. Abrir as janelas. Ok. Saír de casa o mais depressa possível. Ok. Já todo o prédio tinha sido evacuado. Ok. Estava um cheiro a gás que não se podia na casa. Ok. Já tinham batido à porta por diversas vezes mas eu não abrira. Ok, portanto: o prédio estava quase a explodir mas eu estava felicíssima a gabar os meus dotes de "fuga ao vendedor", enquanto cantava alegremente: Hate it or love it the underdogs' on top and I'm gon' shine, homey until my heart stop. Mal sabia eu que estava perto. Não só do coração parar mas do prédio todo ir pelos ares! Lá fora, na rua, retroescavadoras, polícias, magotes de gente, bombeiros, ambulâncias. Cá dentro, no quarto, dançava (a expressão aplica-se mais que nunca): como se não houvese amanhã.

1 comment:

Daniela Sousa Photography said...

Bem que episódio...
Agora vais ter de abrir a porta a todos os vendedores e afins...
;)